Terça-feira, 16 de Dezembro de 2014

Para Uma Consciência do Som

 

Há bem pouco tempo, a humanidade descobriu que as partículas do átomo de oxigénio protões e neutrões, vibram numa escala melódica maior, que os talos dos cereais que crescem, cantam cada um a sua própria canção e que todos ressoam num uníssono harmonioso; também ficámos a saber que ao processar-se a fotossíntese se ouvem trítonos e que a sexualidade é um fenómeno musical...

Até à pouco, o tempo e a matéria, eram os alicerces do conhecimento, sendo mesuráveis, avaliáveis e previsíveis.

Hoje os físicos estão diante de destroços. Uma das poucas certezas de que dispomos, é que o mundo é som, ritmo e vibração.

As descobertas da ciência moderna e as ideias desenvolvidas em vários movimentos sociais estão a mudar radicalmente a nossa visão do mundo. Lentamente uma nova perspetiva da realidade surge e esta será o alicerce futuro das ciências, da filosofia, da tecnologia e da economia – Este novo paradigma é uma visão holística do mundo.

Há que mudar o conceito de estrutura para o de ritmo a fim de que consigamos obter uma descrição coerente da realidade, capaz de integrar as descobertas mais recentes da física e das ciências da vida...Em todo o universo há padrões rítmicos - O mundo é som!

Desde o entrelaçamento dos padrões rítmicos da comunicação humana, das vibrações das moléculas e dos átomos, até aos “ritmos estáticos” dos cristais, aos padrões regulares dos organismos vivos, até à geometria sagrada presente em código nas grandes catedrais europeias; Tudo obedece à lei da harmonia musical.

Mas o padrão universal dinâmico, não consiste somente em vibração, ele vibra em proporções harmónicas.

Por entre biliões de vibrações possíveis, o universo opta com visível predileção, por aquelas poucas mil que têm um sentido harmónico.

Porquê?

A maioria de nós não percebe que o mundo existe de forma independente; para sermos mais precisos, somos nós que o criamos com os nossos processos de cognição e de perceção. No caso de organismos diversos, como as plantas, estes processos diferem, uma vez que dispõe de órgãos de perceção diferentes, o que os leva à criação de mundos próprios.

A compreensão de que o mudo é som, tem atualmente implicações profundas, refletindo-se, não somente na ciência e na filosofia, como ainda na nossa convivência quotidiana e sobretudo incidindo na nossa sociedade.

Se observarmos a palavra convivência, cuja raiz etimológica é constituída por dois elementos importantes, o prefixo “com” de origem latina “cum” e a raiz “vivência”. Este prefixo serve para marcar uma variedade de relações entre diferentes indivíduos ou situações. Por conseguinte “com” não é usado num contexto de singularidade pois o seu propósito é estabelecer relações com alguém, sendo pelo menos necessárias duas pessoas para que “com” tenha sentido. Assim a preposição adquire o seu sentido na medida em que serve para unir e não para separar elementos diferentes. Isto conduz-nos à ideia de conjunto, de companhia. É o passar da vivência explorativa para a vivência ecológica, assente na noção de cuidar do outro.

Desde há séculos que o ocidente coloca uma ênfase exagerada na visão, em detrimento da audição. Na atual mudança de paradigma, é urgente incluir uma modificação consciente e essencial dessa ênfase, que se deverá conduzir da visão para a audição.

Esta modificação “dos olhos para os ouvidos”, coincide com uma mudança de valores: dos masculinos, ou seja da cognição pela visão para os femininos, o que significa dizer para a cognição pela audição, que tantas vezes tem sido associada à nossa transformação cultural, refletindo-se da análise para a síntese, do conhecimento racional para a sabedoria intuitiva, do domínio e da agressividade para a não-violência e para a paz...

As pessoas desta geração, conhecem intuitivamente a vibração e o som. Este é um sinal do processo de consciencialização que ocorre nos dias em que vivemos. A presença desta nova consciência é sentida mesmo por aqueles que a recusam.

Nesta época em que a humanidade gasta milhões por minuto para a sua possível extinção, pode-se prever o fim de todos nós. E é essa a nossa experiência: seja o que for que a humanidade possa fazer – acaba por realiza-lo! Antes, somente as pessoas intuitivas sabiam disto, agora quase todos os sabem.

Encarar a verdadeira situação do mundo, é psiquicamente insuportável...

Embora esta seja uma afirmação polémica, o facto é que o raciocínio científico está diretamente relacionado com as graves ameaças à humanidade. Contudo não é possível dentro das diretrizes essenciais da ciência moderna, criar soluções eficazes para eliminação destas ameaças.

Enquanto isto, o fantasma da ingovernabilidade surgiu nos países industrializados, sendo que hoje alguns deles têm problemas maiores que os do 3º mundo. Mas se só uma nova consciência é capaz de nos libertar, isso significa dizer que, não podemos modificar o mundo a menos que nos modifiquemos, pois nós somos (o) mundo! Qualquer outro caminho é absurdo.

Tudo o que se modificou profundamente, mudou 1º na consciência de cada ser humano. Só depois é que isso se refletiu na transformação em que vive a coletividade humana. – Sabemos que tudo é um, de tal forma que o nosso intelecto pode compreende-lo ao mesmo tempo científica, matemática e experimentalmente.

Muito se tem falado sobre a nova consciência, mas, ainda não foi mencionado em nenhum lugar que há uma consciência das pessoas que ouvem. Nelas o som audível é mais importante que o som visível. Nelas os olhos não têm predomínio em relação aos ouvidos, pelo contrário, predominam sobre aqueles.

A pessoa que vê, analisa, separa as coisas em partes. O homem da visão acumulou de tal sorte a racionalidade que hoje estamos a assistir à sua ruína. Na era da televisão as pessoas que só veem, deixam-se conduzir, ad absurdum.

O símbolo dos ouvidos, é a concha que também simboliza o órgão sexual feminino – símbolo de recetividade e aconchego. No homem que ouve, a vida não é analisada, é aceite como um todo, ela é a realidade que está aí.

Os ouvidos têm a sua perceção mais apurada que os olhos e o tato. Os orientais consideravam os olhos um órgão Yang e os ouvidos um órgão Yin.

Para este o todo é mais importante que as partes, a síntese mais importante que a análise. Os inter-relacionamentos mais importantes que a especialização. O homem moderno perdeu-se devido à hipertrofia da audição. Não dá mais ouvidos ao divino em si. O âmbito da visão é a superfície, o da audição é a profundidade. A pessoa que ouve tem mais oportunidade de aprofundar-se do que aquela que vê.

Urge pois reaprender a ver corretamente. No mundo ocidental existe desde o mundo grego e o Renascimento, a tradição do culto aos olhos, à luz, à visão; mas nada no mundo se compara àquilo que se refere à audição. A profunda modificação da consciência somente será uma realidade quando aprendermos a usar inteiramente o nosso sentido da audição, pois só assim corrigiremos a hipertrofia de que temos sido vitimas. Como disse Goetheos olhos do espírito têm de ver em uníssono com os olhos físicos, caso contrário, há o risco de ficarmos a olhar e, no entanto as coisas passarem despercebidas

  1. Porque é que a evolução diferenciou com tanto cuidado o nosso sentido da audição?
  2. Porque é que ela ocultou aqui a capacidade de avaliação?
  3. Porque é que nesta evolução se oculta ao mesmo tempo, a capacidade da transcendência e, acima de tudo, a capacidade do equilíbrio?
  4. Porque é que os dados que recebemos pelos ouvidos são mais exatos que os da visão?
  5. Porque é que o alcance do que podemos ouvir é 10 vezes maior do que o que podemos ver?
  6. Porque é que os homens não dão atenção ao que dizem as mulheres?
  7. Porque è que as vozes femininas são mais agudas que as masculinos?
  8. Porque motivo a ciência convencional ignorou o facto de que na natureza as vozes agudas têm uma função de liderança?
  9. Os instrumentos de tonalidade mais aguda (violinos, flautas, etc.) tocam a melodia, enquanto que os de tonalidade mais grave (violoncelos, baixos, trombones, tubas) em geral tocam o acompanhamento?
  10. Estes só podem ser considerados instrumentos melódicos, quando os mais agudos se mantêm em silêncio.
  11. O que é que tudo isto nos diz...?
  12. Porque é que o mundo científico dominado pelos homens, deixou de ver, deixou de “ouvir” estas questões?

Numa coleção de koans do Zen de 1783 o monge japonês Genro, de Quito diz “Uma doutrina que ignora a vida quotidiana, não é uma verdadeira doutrina”

No nosso ouvido há um templo, naqueles que ouvem a Alma viverá.

O som, ou a correnteza da consciência, é mais certo do que o Tempo e a Matéria...

“Se você anular os seus sentidos e o som, o que é que você ouve?”

 

Danuia Pereira Leite

 

Referências Bibliográficas

  • «O Poder Curador da Música», Mcclellan , Randall
  • «Inteligência Emocional», Golman, Daniel
  • «Musicofilia», Sacks, Oliver

 

Publicado por Re-ligare às 11:32
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